O que vou falar agora pode parecer contra dizer meu texto anterior. Mas por que? Porque " A felicidade sem preço" parece utopia e conforme o momento é. Há momentos que não temos nem dez reais na carteira, e fica impossível pegar um ônibus e se locomover até muitos pontos lindos que existem aqui na nossa ilha. A não ser que você more em algum destes paraísos. Mas pode ter momentos que você queira assistir uma peça no teatro ou ir ao cinema, e nestes lugares nem sempre há um cinema. Então você vai precisar ir ao centro da cidade. Ou você pode optar por alugar um DVD e vai precisar de no mínimo uns tres reais. Muitos podem questionar: Quem não tem tres reias no bolso? Muita gente! Eu mesmo em algumas situações tive vontade de comprar uma pipoca quentinha na rua, mas só tinha a passagem do ônibus pra voltar pra casa. Veja que já cheguei nesta situação. Claro, não é de espantar-se, sou professora, pós-graduada, efetiva vinte horas na rede pública do estado de Santa Catarina, Brasil. Além disso parte do meu salário está sendo aplicando para pagar meu mestrado, fora do país, já que aqui não recebo incentivo para estudar. Além disso tenho uma filha para sustentar.
Meus pais me educaram para ter minha independencia, pra ter uma vida digna, para não passar as necessidades que eles um dia passaram na infância. Minha mãe professora de Língua Portuguesa, meu pai técnico agrícola de uma empresa que hoje chama-se EPAGRI. Nada me faltou na infância, não éramos ricos, mas tinhamos uma vida confortável, sem esbanjar. Imagino que se meu pai, de algum lugar em outro plano me observa, deve orgulhar-se de mim, por levantar a bandeira pelos valores que ele me passou e que acredito, mas ao mesmo tempo ele deve entristecer-se por ver a situação à qual eu e muitas pessoas dessa sociedade que levantam essa bandeira temos que nos sujeitar.
Mil reais um dia era um bom dinheiro, hoje o que aconteceu? A moeda perdeu o valor, os impostos aumentam dia a dia, em troca disso a educação pública está um caos, a sáude está morrendo, a segurança pública está perdendo o controle da situação e os valores éticos e morais, tem gente que nem sabe mais o que é isso. Valor na nossa sociedade hoje, é o seguinte: você pode ser um professor, um doutor, um sábio, um cientísta, um ótimo pai de família, um cidadão de bem, não importa, o que vale é quanto você tem na conta bancária! E não pensem que estou aqui simplesmente para lamentar da minha situação, que em vista de muitos brasileiros não é a melhor, mas também não é a pior. Porque eu me viro. Com fé, com o meu conhecimento, a minha educação, os meus valores que me ajudam a administrar o pouco que ganho, a ser menos materialista e assim consumir menos. Não sou uma consumidora compulsiva, ainda bem. E não quero ser.
Mas quando penso no todo da sociedade me revolto! Me sinto refém em meu próprio país, em meu Estado, em minha cidade. Refém dos impostos que somos obrigada a pagar, que consomem parte do suado dinheirinho e que não tem nenhum ou quase nenhum retorno, quando pensamos nas péssimas condições à qual somos submetidos quando precisamos da prestação de um serviço público; Refém da violência que está solta na rua e que tem sua origem na falta de educação, de um governo que prioriza o crescimento econômico, paga vinte e cinco mil reais para um deputado e chora pra pagar dois mil para um professor, quando paga isso; Refém de uma sociedade que está vivendo para o ter.
Não vou discutir aqui os valores de cada um. Tem pessoas que sentem prazer em colecionar bens materiais, gostam de passar parte do tempo no trabalho, se sentem felizes assim, que ótimo. Cada um é livre pra viver dentro do que acredita. Mas para mim e para muitas dessa sociedade, o cultivo do ser tem muito significado e precisamos dele para viver a vida na sua plenitude: O cultivo do ser através do encontro consigo mesmo, com o outro, com Deus e com a natureza; O respeito pelo ser vivo, a solidariedade e também o auto-cuidado; O alimento do espírito e da mente através de hábitos de leitura, do contato com a arte, nas suas mais diferentes formas. Tudo isso resumido em "qualidade de vida". E AÍ NOS DEPARAMOS COM UMA FACA DE DOIS GUMES: para ter essa qualidade de vida, preciso de um tempo pra mim e como ter um tempo pra mim se preciso cada vez trabalhar mais para ter o mínimo de condição dígna de vida?
Conversei com uma senhora, catadora de reciclado, para a qual sempre deixo separado meu lixo, como forma de ajudá-la e ao mesmo tempo cuidar do meio ambiente. É sua única renda, seu estado é descuidado, sofrido e contou--me que está muito doente e que depende do SUS (sistema único de saúde) que a ajuda muito precariamente. Ela tem uma filha, e o dinheiro do lixo que ela está coletando essa semana, é exclusivamente para comprar o gás. Não reclamo da minha situação, mas não quero chegar na situação desta senhora. Que qualidade de vida ela pode ter? Que qualidade de vida um desempregado poder ter ou um trabalhador que trabalha oito a doze horas por dia pode ter, que qualidade de vida um professor que trabalha sessenta horas por semana pode ter? Se temos dinheiro não temos tempo, se tem tempo não tem dinheiro, e assim nos tornamos reféns e escravos de um sistema! Eu optei trabalhar vinte horas por dia, para poder ter mais tempo para cuidar da minha família, de mim, para estudar, me aperfeiçoar na minha profissão, mas está sendo quase impossível. Por isso me sinto refém, se não cuidar me torno escrava. Onde essa sociedade vai parar assim? Vivemos o capitalismo selvagem, o materialismo doentio que está atingindo todas as camadas da sociedade e que se não nos dermos conta também nos contaminará.
Peço sugestões aos leitores deste texto, que deixem suas experiências, vamos discutir formas de bem viver com equilíbrio dentro desse sistema capitalista que sufoca e escraviza. Como contribuição ao planeta e às pessoas que ainda querem cultivar o ser e que estão se sentindo refém de um sistema doentio e egoísta que somente se preocupa com o ter e que está extinguindo os seres vivos e a mãe natureza!